Battle Royale | Como estragar uma boa história


Capa do mangá Battle RoyaleA premissa de BATTLE ROYALE diz tudo:

“No país chamado Grande República do Leste Asiático, o governo autoritário realiza de tempos em tempos um experimento conhecido como O Programa, um jogo mortal televisionado para o país inteiro. As ‘cobaias’ do experimento são selecionadas entre as classes do último ano do ensino fundamental de todo o país. As regras do jogo são simples: matar ou morrer até restar apenas um aluno sobrevivente. Os 42 alunos do 3º ano B jamais poderiam imaginar que sua classe seria a escolhida para fazer parte desse jogo de vida ou morte!!” (texto da capa do primeiro volume da edição lançada no Brasil pela Conrad)

Interessante sinopse, com boa resolução em várias mídias e final emocionante. Foram produzidos até o momento em torno desta história: um livro – que originou tudo –, dois mangás e dois filmes.

Para esta Observação foi selecionado o primeiro quadrinho produzido, e único lançado no Brasil até o momento, e que chama atenção por grandes momentos de tensão ao longo de seus quinze volumes, mas com diversos acontecimentos que desencorajam bastante o leitor (ou o empolgam mais, vai saber).

UM POUCO DEMAIS, NÃO?

Battle Royale é uma história séria, nos mostra o terror psicológico no qual se envolvem os jovens ao serem levados a participar deste experimento. É sanguinolento e deveras cruel em certos momentos. Entretanto, também chama bastante atenção por exageros, seja na própria história ou no trabalho do desenhista Masayuki Taguchi, com um traço muito esdruxulo em algumas cenas e na expressão de certos personagens.

Veja alguns casos:

Cena do mangá Battle Royalle
Nanahara no alto à esquerda
- O protagonista Shuya Nanahara é praticamente um ser perfeito e de pura bondade: esportista de primeira – tanto em beisebol quanto em basquete – e guitarrista – mesmo o rock sendo proibido pelo governo –, todas as garotas são suas fãs e desejam ficar com ele. Além de sempre esperar o melhor do mundo inteiro, até mesmo dos grandes vilões entre os 42 jovens.

- Vários personagens parecem ser adeptos de artes marciais, atletas ou até mesmo ninjas para realizar alguns feitos. Caso, por exemplo, de Nanahara, seus amigos Shinji Mimura e Hiroki Sugimura, Takako Chigusa, Mitsuko Souma e Kazuo Kiriyama. Tudo bem! Há de se concordar que alguns são realmente apontados como esportistas e praticantes de artes marciais, mas, como mostram as imagens abaixo, se utilizam de saltos ornamentais dignos de grandes mestres.

Cena do mangá Battle Royalle
Kiriyama aplica um golpe (?) em Hiroki
Sugimura

Cena do mangá Battle Royalle
Nanahara parecendo um super jogador
de beisebol

Cena do mangá Battle Royalle
Shinji Mimura dando
golpes em um velho
que mexia com seu
amigo

Cena do mangá Battle Royalle
Kiriyama arrancando o olho de um professor (??)















- Kiriyama: se era tão inteligente e superior aos demais porque não recebeu tratamento diferenciado pelo governo, escola ou qualquer outra instituição em nenhum momento da sua vida? E mais, o personagem é um verdadeiro Robocop, captando rapidamente as informações em livros e rapidamente aplicando as lições apreendidas. O relato de sua vida, com as desculpas para ele ser o que é, é totalmente bizarro. Não há nenhum sentido naquilo.

ELEMENTOS DO MANGÁ

A de se convir que é natural no mundo dos quadrinhos um certo exagero de algumas coisas em relação à realidade. Além disso, é bom afirmar que em nenhum momento o mangá Battle Royale se propõe a ser fiel ao mundo real.

O uso de ‘exageros’ – na falta de uma definição melhor, vou chamar assim – é bastante comum nas histórias em quadrinhos japonesas, como essas abaixo:

- Gota de água que aparece do lado do rosto do personagem representando constrangimento;

- Diminuição súbita do personagem representando vergonha ou medo;

- Nervos estilizados, dentes ou chifres aparecendo repentinamente nos personagens representando raiva ou maldade.
(fonte: WIKIPEDIA)

Battle Royale, no entanto, não é uma história de aventura ou humor, onde é mais comum acontecimentos do tipo mencionado acima. Os exageros do desenhista também não é nenhum desses. Ele peca ao abusar do desespero ou da loucura de alguns personagens, ao ponto de parecerem caricaturas ou máscaras.

Mas o mais surpreendente fica para o final. Kazuo Kiriyama deve ser quase um imortal, afinal leva ao longo da história no mínimo uns vinte tiros, duas flechadas (sendo uma no olho), alguns socos e tem uma bomba (cuja explosão é ouvida em toda a ilha) jogada nos seus pés. Detalhe: um dos tiros é na cabeça. E ele levanta parecendo um zumbi para continuar atirando até levar a última e fatal bala. A sedutora Mitsuko Souma é outra que leva vários tiros antes de morrer.

Cena do mangá Battle Royalle
Kiriyama de pé mesmo após ter levado muitos tiros (inclusive
um no rosto), duas flechadas (uma no olho, como pode ver) e
escapado inexplicavelmente de uma bomba (???)
Para quem esperava algo sério, isso é um banho de água fria.

EXAGEROS DE UM LADO, EXAGEROS DE OUTRO!

A comparação com o filme demonstra ainda mais a queda da qualidade do mangá enquanto ruma para o final apoteótico. Por ser mais compacto, o longa-metragem mantém foco no casal protagonista, é mais objetivo em algumas mortes e nas ações de alguns personagens. As duas principais diferenças são:

- Ninguém no filme tem corpo atlético ou dá pulos de atletas ou ninjas.

Capa do filme Batalha Real (Battle Royalle)- Kiriyama tem sua história simplificada (aqui ele é colocado no jogo pelo governo para dar mais ação. E nas palavras de Shogo Kawada, “entrou apenas para matar”) e morre depois de poucos tiros (embora ainda insistam que ele não pode morrer no primeiro).

Por outro lado, o filme peca pela rapidez das mortes e a falta de nexo em momentos, tais como:

- Por que os soldados responsáveis pelo Programa vão embora quando supostamente sobra apenas um estudante na matança deixando para traz seu líder (no filme, Kitano, um ex-professor da turma)? Chamo atenção que no começo do longa é mostrado a vencedora da edição anterior louca sendo carregada por militares. Eles não teriam que agir igual?

- Por que o mesmo professor Kitano protege Noriko Nakagawa cedendo-lhe o guarda-chuva em determinado momento do filme (uma resposta séria de preferência, a mencionada, que ele faz menção a ela ser a única decente para matá-lo, é muito tosca e não funciona)?

- O Programa em si no filme não é bem um programa, afinal do modo como é mostrado parece ser apenas uma edição.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Battle Royale é extremamente denso, renderia conversa por horas e horas. Por conta disso, optou-se aqui por fazer uma crítica aos exageros cometidos principalmente pelo responsável pelo mangá.

O quadrinho prende a atenção do leitor facilmente por conta da sinopse ser deveras interessante. Mas por volta do volume 11, os tais exageros começam a chamar mais atenção da história do que a história em si e a qualidade cai bastante, principalmente pela insistência em manter Kiriyama vivo. Embora nada que estrague a resolução final.

Um ponto importante é que embora seja dito que O Programa é um experimento televisionado, ou seja, uma espécie de reality show, nem o mangá, nem o filme exploram isso. Uma falha, afinal poderíamos ver como reagiriam os espectadores.

Capa do filme Battle Royale II: Requiem
Capa do mangá Battle Royale 2: Blitz Royale Como curiosidade, no segundo filme, intitulado Battle Royale 2: Réquiem, Nanahara volta para combater o governo da Grande República do Leste Asiático (na verdade, uma crítica ao Japão) para pôr fim ao bizarro jogo. Consegue estragar tudo que foi feito desde então.

O segundo mangá, Battle Royale 2: Blitz Royale se destaca mais pelo desenho, bem infantilizado, do que pela história, cuja qualidade não pode ser conferida por não haver edição em português.


BATTLE ROYALE
Roteiro: Koushun Takami
Desenhos: Masayuki Taguchi
Volumes: 15
Editora: Conrad
Ano de publicação: 2006 a 2011

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